O Brasil caiu da 9ª para a 12ª posição entre as maiores economias do mundo

O Brasil teve na década encerrada em 2020 o seu segundo período de dez anos perdidos para a economia. Assim como aconteceu na década de 1980, o País vinha de um período anterior positivo e apresentou forte retração. No mais recente, o Brasil, após crise de recuperação lenta e não concluída, viu-se enfrentando novos mares turbulentos em 2020, com o início da pandemia. O resultado negativo do Produto Interno Bruto (PIB) no pior nível em três décadas fez com que o País retrocedesse no ranking das maiores economias do mundo.

Com a retração de 4,1% no ano passado, o Brasil caiu da 9ª para a 12ª posição entre as maiores economias do mundo, segundo dados do PIB nominal em dólares. A economia brasileira foi superada por Canadá, Coreia e Rússia. E, segundo projeções da Austin Rating – agência classificadora de risco de crédito de origem brasileira -, há a possibilidade do País entrar em 2022 como a 14ª economia do mundo.

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O “empobrecimento” do Brasil no cenário internacional alia um conjunto de fatores – que são problemas antigos – que evoluíram muito nos últimos anos, especialmente quando o País entrou em crise, entre 2014 e 2016, após um período próspero no início dos anos 2000, em que figurou entre as sete maiores economias do mundo, bem próximo da sexta maior.

Lauro Chaves Neto, membro do Conselho Federal de Economia (Cofecon) e professor da Universidade Estadual do Ceará (Uece), analisa que por ser uma comparação definida em dólar, que está valorizado – o real está em um de seus períodos mais desvalorizados desde o Plano Real -, o Brasil tem desvantagem, mas essa desvalorização do real é só uma das faces da crise. As principais, destaca, são a desigualdade social e a desigualdade de desenvolvimento territorial que contribuíram para agravar os impactos dos problemas econômicos internos.

Lauro Chaves é membro do Conselho Federal de Economia (Cofecon)
Foto: TATIANA FORTES
Lauro Chaves é membro do Conselho Federal de Economia (Cofecon)

A pandemia foi um evento determinante nesse movimento, pois desmascarou qualquer traço de país que, mesmo com tanta pobreza, sentava na mesa das maiores potências mundiais. “Quando o Brasil entrou na pandemia no ano passado, tínhamos o histórico de 2014 a 2016 ter a maior recessão do período republicano e, de 2017 a 2019, a economia ter patinado com baixo crescimento. Então, aliando a grande desigualdade e os resultados econômicos, explica-se esse empobrecimento.”

Economia muito dependente da força do mercado consumidor interno, o crescimento da desigualdade e aumento de desemprego neste período, aliados ao sistema tributário que piora o ambiente de negócios,  prejudicaram a economia brasileira, acrescenta Lauro. Junta-se nesta equação a maior pandemia em 100 anos, a economia brasileira ficou praticamente paralisada. A queda de 4,1% do PIB ainda foi amortizada por efeito do auxílio emergencial, que beneficiou 1/3 da população e evitou um resultado pior.

O auxílio emergencial de 2020 foi o principal fator para que o Brasil conseguisse recuperar as perdas do PIB no primeiro semestre do ano ao aumentar a atividade econômica, principalmente entre os mais pobres.
O auxílio emergencial de 2020 foi o principal fator para que o Brasil conseguisse recuperar as perdas do PIB no primeiro semestre do ano ao aumentar a atividade econômica, principalmente entre os mais pobres. (Foto: BARBARA MOIRA)

Essa é a pior colocação da economia brasileira no ranking das maiores economias do mundo em pelo menos 60 anos. É bem verdade que o valor nominal do PIB nacional naquela época era bem menor, mas o índice de crescimento anual destacava uma economia pujante em franca elevação.

Ao passo em que o Brasil perde espaço no ranking desde 2011 – e posições a partir de 2014 -, outras nações subdesenvolvidas, como Índia (chegou à 6ª posição entre as maiores economias em 2017), Rússia (chegou à 8ª posição em 2012 e ultrapassou o Brasil em 2020), além da China (quase triplicou seu PIB nominal entre 2010 e 2020), cresceram.

Pandemia de coronavírus começou na China e se espalhou pelo planeta, mas país conseguiu reagir rápido e fechou o ano de 2020 com crescimento da economia.
Pandemia de coronavírus começou na China e se espalhou pelo planeta, mas país conseguiu reagir rápido e fechou o ano de 2020 com crescimento da economia. (Foto: XINHUA / AFP)

Antônio Maristrello Porto, doutor em Direito pela University of Illinois e coordenador do Centro de Pesquisa em Direito e Economia (CPDE) da Fundação Getúlio Vargas (FGV), considera que, em 2020, houve um empobrecimento não só do Brasil, mas de todas as economias do mundo. Na América Latina, por exemplo, México caiu mais de 10% e Argentina quase na mesma medida.

 

Avaliação por outra ótica

 

Vale destacar que a análise das economias com paridade do poder de compra (PPP), métrica que diminuiu a influência do câmbio na conta ao congelar os preços do mercado, revela que o Brasil tem mantido sua posição. A última queda de patamar foi entre 2016 e 2017, caindo de 7ª para 8ª no ranking das maiores economias em paridade.

Segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), em 2019, o País tinha US$ 2,4 trilhões de PIB a preços de 2000. A projeção para 2020, mantendo o mesmo critério, é manter a posição, mas com perda de mercado, com PIB em PPP na ordem de US$ 2,3 trilhões. 

“Normalmente, quando se compara as economias mundiais baseando-se no câmbio em dólar, o resultado é especulativo. Não observo tamanho retrocesso no poder de compra real da população nacional frente ao observado em outros países. Mas, como a gestão da pandemia foi mal realizada, podemos retroceder por mais tempo que o resto do mundo”, destaca Porto.

Antônio Martistrell Porto, coordenador do Centro de Pesquisa em Direito e Economia (CPDE) da Fundação Getúlio Vargas (FGV), considera que a gestão da pandemia foi mal realizada no Brasil e que é possível retroceder por mais tempo .
Antônio Martistrell Porto, coordenador do Centro de Pesquisa em Direito e Economia (CPDE) da Fundação Getúlio Vargas (FGV), considera que a gestão da pandemia foi mal realizada no Brasil e que é possível retroceder por mais tempo . (Foto: Divulgação / FGV)

Porto acrescenta que o grande problema enfrentado pelo Brasil foi a desvalorização do poder de compra, especialmente dos mais pobres. Isso aconteceu na mesma medida em que aqueles que tinham garantia de salário não sofreram quase nenhuma perda. Indo além do olhar nacional, ele ainda observa no quadro de combate à pandemia ao redor do mundo diferenças importantes de realidades entre os países. “A pandemia não pode ser tratada igualmente na Alemanha e no Brasil, por exemplo. Nos países mais pobres, a pandemia e o lockdown atingiram de maneira muito mais forte.”

Moradores em situação de rua na Praça do Ferreira, no Centro de Fortaleza, no pico da primeira onda da pandemia na Capital
Moradores em situação de rua na Praça do Ferreira, no Centro de Fortaleza, no pico da primeira onda da pandemia na Capital (Foto: Aurelio Alves/O POVO)

 

Ritmo do Brasil vs ritmo do resto do mundo

 

Se o Brasil não conseguiu acompanhar o período de franco crescimento da economia mundial entre 2014 e 2018, apresentando queda do PIB e crescimentos mínimos no período, em 2020 o País completou 40 anos em que sua economia cresce abaixo do ritmo mundial.

Um levantamento realizado pela página Economista Visual, com dados do FMI e do Ministério da Economia, destaca que o avanço da economia mundial entre 1981 e 2020 foi de 264%, enquanto a economia brasileira cresceu 121,8% no mesmo recorte.

Na última década, entre 2011 e 2020, a disparidade foi a maior do período, com crescimento mundial de 30,5% e nacional de 2,2%. Os dados apontam que, mesmo década de maior crescimento recente (2001-2010) teve ritmo menor que o mundial, de 43,5% frente a 46,9% do mundo.

 

Auxílio emergencial deu help ao PIB

 

O relatório Artigo IV do Fundo Monetário Internacional (FMI), que trata do Brasil, divulgado em dezembro de 2020, destacou que o Governo Federal respondeu rapidamente à crise causada pela pandemia do novo coronavírus com a criação do Auxílio Emergencial. Segundo o documento divulgado anualmente pela instituição financeira, o benefício que atingiu diretamente 67,8 milhões de pessoas – cerca de um terço da população – superou os impactos negativos gerados pela paralisação da atividade econômica. O investimento no programa passa de R$ 260 bilhões. 

O FMI aponta que até 23 milhões de cidadãos deixaram de entrar na extrema pobreza no auge da pandemia. Sem o Auxílio Emergencial, esse percentual teria aumentado de 6,7% para 14,6%. Além disso, o benefício fez a taxa de pessoas pobres no País diminuir para 5,4%. Programas de preservação do emprego, suporte financeiro para os estados e crédito para os pequenos negócios também foram apontados no relatório como iniciativas que ajudam o País a enfrentar as adversidades.

Na avaliação da economista com doutorado pela Université de Paris X e professora da Universidade de Brasília (UnB), Maria de Lourdes Mollo, o resultado do PIB brasileiro do ano passado foi ruim, como para todos os países do mundo em meio à pandemia, mas melhor do que estava sendo esperado. O que fez isso acontecer em grande parte foi o auxílio emergencial de R$ 600 no início da crise.

Neste ano, a grande queda do valor do auxílio deve representar efeito positivo menor na economia nacional, avalia. “Na medida em que essas pessoas gastem, estimula diretamente os setores porque é uma população que dedica todo o valor ao consumo. Com o auxílio, estimulamos a atividade econômica e resolvemos o problema social”.

 

O futuro da economia brasileira e mundial

 

Com base em projeções do FMI, com o PIB em dólares, a economia brasileira regrediu entre 2019 e 2020, de US$ 1,8 trilhão para US$ 1,4 trilhão. No seu documento mais recente, o Panorama Econômico Mundial, há a projeção de recuperação forte da economia global em 2021 e 2022. O ritmo, porém, será marcado pela desigualdade. E nessa conta o Brasil sai atrás. 

O Fundo projeta que o crescimento mundial estimado é de 6% em 2021 e 4,4% em 2022. A projeção para o Brasil, porém, se manteve praticamente inalterada, na comparação com a divulgada em janeiro. A expectativa é que a economia brasileira cresça 3,7% neste ano e 2,6% em 2022. Em janeiro, a projeção era de crescimento de 3,6%. Os números do Fundo são mais otimistas que os do mercado financeiro brasileiro. O Boletim Focus, do Banco Central, projeta um crescimento do PIB de 3,17% este ano.

O FMI considera a situação da discrepância de ritmo de crescimento na retomada como “desafios assustadores” pelo potencial de danos persistentes. Enquanto os Estados Unidos devem superar o PIB da época anterior à pandemia neste ano, outras economias avançadas estarão nesse ponto apenas no ano que vem. Entre os emergentes, a China já voltou aos níveis pré-Covid no ano passado, enquanto outros do grupo só chegarão lá em 2023. 

Para recuperar seu espaço no cenário econômico internacional, os analistas são assertivos: a vacinação em massa é prioridade. “Na medida em que as pessoas estejam vacinadas, a economia poderá retornar de forma sustentável e sem retrocesso”, aponta Maria de Lourdes Mollo. Ela ainda acrescenta que, para aplacar os iniciais efeitos sociais da crise, será necessário ampliar o valor do benefício emergencial do governo.

“O estado precisa fazer ações coordenadas de sustentação de demanda e de vacinação para reduzir o contágio. Nenhuma estratégia de desenvolvimento pode ser bem feita sem a saída da pandemia. Estamos numa situação mais grave do que em outros países e as nossas maiores perdas são em vidas”, analisa a doutora em Economia.

Maria de Lourdes Mollo, doutora em Economia e professora da Universidade de Brasília (UnB).
Maria de Lourdes Mollo, doutora em Economia e professora da Universidade de Brasília (UnB). (Foto: Divulgação / UnB)

Para Antônio Maristrello Porto, o Brasil ainda terá de recuperar seu potencial ao rever políticas econômicas e de gestão. “O governo parou de investir e passou a gastar em consumo de governo, também houve uma grave redução de produtividade no Brasil (que precisa ser revertida).”

Já o economista Lauro Chaves afirma que a principal demanda do Brasil no processo de recuperação é encontrar o seu posicionamento nas cadeias globais de valor, aliando desenvolvimento tecnológico e internacionalização dos negócios. “Precisamos atuar fortemente nas cadeias em que somos competitivos, ter ação proativa no comércio internacional, pois o Brasil ainda é muito engessado. Sem essa iniciação internacional maior da economia brasileira, sempre ficaremos um passo atrás no ritmo em comparação com outros países. A economia precisa de internacionalização e inovação.” (Com informações da Agência Estado)

 

 

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O que será do futuro da economia brasileira e mundial após a pandemia

Com base em projeções do FMI, com o PIB em dólares, a economia brasileira regrediu entre 2019 e 2020, de US$ 1,8 trilhão para US$ 1,4 trilhão. No seu documento mais recente, o Panorama Econômico Mundial, há a projeção de recuperação forte da economia global em 2021 e 2022. O ritmo, porém, será marcado pela desigualdade. E nessa conta o Brasil sai atrás.

O Fundo projeta que o crescimento mundial estimado é de 6% em 2021 e 4,4% em 2022. A projeção para o Brasil, porém, se manteve praticamente inalterada, na comparação com a divulgada em janeiro. A expectativa é que a economia brasileira cresça 3,7% neste ano e 2,6% em 2022. Em janeiro, a projeção era de crescimento de 3,6%. Os números do Fundo são mais otimistas que os do mercado financeiro brasileiro. O Boletim Focus, do Banco Central, projeta um crescimento do PIB de 3,17% este ano.

O FMI considera a situação da discrepância de ritmo de crescimento na retomada como “desafios assustadores” pelo potencial de danos persistentes. Enquanto os Estados Unidos devem superar o PIB da época anterior à pandemia neste ano, outras economias avançadas estarão nesse ponto apenas no ano que vem. Entre os emergentes, a China já voltou aos níveis pré-Covid no ano passado, enquanto outros do grupo só chegarão lá em 2023.

Para recuperar seu espaço no cenário econômico internacional, os analistas são assertivos: a vacinação em massa é prioridade. “Na medida em que as pessoas estejam vacinadas, a economia poderá retornar de forma sustentável e sem retrocesso”, aponta Maria de Lourdes Mollo, economista com doutorado pela Université de Paris X e professora da Universidade de Brasília (UnB). Ela ainda acrescenta que, para aplacar os iniciais efeitos sociais da crise, será necessário ampliar o valor do benefício emergencial do governo.

“O estado precisa fazer ações coordenadas de sustentação de demanda e de vacinação para reduzir o contágio. Nenhuma estratégia de desenvolvimento pode ser bem feita sem a saída da pandemia. Estamos numa situação mais grave do que em outros países e as nossas maiores perdas são em vidas”, analisa a economista.

Para Antônio Maristrello Porto, o Brasil ainda terá de recuperar seu potencial ao rever políticas econômicas e de gestão. “O governo parou de investir e passou a gastar em consumo de governo, também houve uma grave redução de produtividade no Brasil (que precisa ser revertida).”

Já o economista Lauro Chaves afirma que a principal demanda do Brasil no processo de recuperação é encontrar o seu posicionamento nas cadeias globais de valor, aliando desenvolvimento tecnológico e internacionalização dos negócios. “Precisamos atuar fortemente nas cadeias em que somos competitivos, ter ação proativa no comércio internacional, pois o Brasil ainda é muito engessado. Sem essa iniciação internacional maior da economia brasileira, sempre ficaremos um passo atrás no ritmo em comparação com outros países. A economia precisa de internacionalização e inovação.” (Samuel Pimentel e Agência Estado)

AUXÍLIO EMERGENCIAL “SALVOU” O PIB

O relatório Artigo IV do Fundo Monetário Internacional (FMI), que trata do Brasil, divulgado em dezembro de 2020, destacou que o Governo Federal respondeu rapidamente à crise causada pela pandemia do novo coronavírus com a criação do Auxílio Emergencial. Segundo o documento divulgado anualmente pela instituição financeira, o benefício que atingiu diretamente 67,8 milhões de pessoas – cerca de um terço da população – superou os impactos negativos gerados pela paralisação da atividade econômica. O investimento no programa passa de R$ 260 bilhões.

O FMI aponta que até 23 milhões de cidadãos deixaram de entrar na extrema pobreza no auge da pandemia. Sem o Auxílio Emergencial, esse percentual teria aumentado de 6,7% para 14,6%. Além disso, o benefício fez a taxa de pessoas pobres no País diminuir para 5,4%.

Programas de preservação do emprego, suporte financeiro para os estados e crédito para os pequenos negócios também foram apontados no relatório como iniciativas que ajudam o País a enfrentar as adversidades.

Na avaliação da economista com doutorado pela Université de Paris X e professora da Universidade de Brasília (UnB), Maria de Lourdes Mollo, o resultado do PIB brasileiro do ano passado foi ruim, como para todos os países do mundo em meio à pandemia, mas melhor do que estava sendo esperado. O que fez isso acontecer em grande parte foi o auxílio emergencial de R$ 600 no início da crise.

Neste ano, a grande queda do valor do auxílio deve representar efeito positivo menor na economia nacional, avalia. “Na medida em que essas pessoas gastem, estimula diretamente os setores porque é uma população que dedica todo o valor ao consumo. Com o auxílio, estimulamos a atividade econômica e resolvemos o problema social.”

Desemprego

O FMI prevê que a taxa de desemprego no País atingirá 14,5% em 2021 e baixará para 13,2% no próximo ano.

Inflação

Previsões do FMI para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) é de que o indicador atingirá 4,6% neste ano e 4,0% no seguinte.

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